Os últimos dois ou três dias foram bem difíceis. Se minhas férias começaram com uma vontade de aproveitar tudo ao máximo, sair bastante e ver o máximo de coisas possíveis, agora estou numa fase de recolhimento, onde eu só quero ficar tranquila.
Hoje acordei muito triste, por isso passei quase o dia todo dormindo (a base de remédio, claro) e chorando. Ainda assim, fiz bastante comida e acabei comendo bastante, o que depois me fez mal, e acabei ficando mais triste. Depois de chorar bastante e ver que não ia conseguir fazer mais que isso, voltei pro meu quarto (que eu não arrumo a cama há dois dias porque não saio dela) e resolvi assistir alguma coisa pra me distrair. Assisti Match Point e gostei muito. Eu devia assistir mais filmes.
Eu adoro o clonazepam principalmente porque em 90% das vezes ele me faz parar de chorar, mesmo que seja um choro de desespero. É o que me faz conseguir parar de chorar e dormir, desacelerar, além de parar os pensamentos também. Continua sendo difícil ficar sem o antidepressivo, mas também continuo achando que vale a pena tentar ficar assim por mais tempo. Seu eu conseguir manter uma rotina boa na faculdade sem ele, acho que fica tudo bem só com o clonazepam.
Nos últimos dias também acho que passei por uma transformação, ou uma contra-reforma, hah. Acho que tinha falado aqui que depois do assalto, eu, pra minha surpresa, mudei muito. Além de quase voltar pra síndrome do pânico, eu estava o tempo inteiro muito irritada com tudo. Tudo mesmo, com as pessoas, com o jeito como as coisas funcionam, com a sociedade em geral e o jeito que ela é. Engraçado, só de escrever isso já quase começo a chorar. É que tudo isso estava me magoando muito, o jeito como as pessoas se tratam e como ninguém está seguro hora alguma. Isso se tornou muito claro pra mim depois do assalto. Não existe, pra mim, nada, nenhuma lei que impeça coisas ruins ou péssimas, trágicas, de acontecerem comigo, com amigos meus ou com minha família. Estar vivo é estar vulnerável, isso é claro pra mim agora. E quando percebi isso, entrei em pânico. A ideia de que tudo pode acontecer a qualquer momento não é só assustadora, é exaustiva também. Computar 200.000 possibilidades pra uma ação só é muita coisa; eu estava entrando num estado de vigilância pessimista que eu conheço muito bem do meu ensino médio. E eu prefiro uma coisa ruim que seja pelo menos uma novidade do que essa tristeza que eu desgastei e que me desgastou.
Bom, passei um bom tempo assim, falando em sair do país o tempo todo, até pensando em como eu poderia fazer isso agora, andando na rua literalmente magoada com todo mundo a ponto de chorar na rua.
Sou assim desde pequena: apesar de passar uma imagem agressiva e mesmo falar sobre agressividade como modo de vida, etc, eu nunca entendi a violência. Pra mim é completamente ilógico machucar qualquer coisa viva de propósito. Isso sempre me parece absurdo, não importa quantas vezes eu veja ou ouça falar sobre isso. E quando a coisa chega mais perto, apesar de eu sempre falar ferozmente em vingança e reações violentas de resposta, eu sempre paraliso. Eu fico atônita e confusa, porque no fundo, não tenho como entender esse tipo de coisa. Por que machucar alguém quando você sabe que esse vai ser o resultado?
Depois de muito tempo sendo um poço de pessimismo, e de sessões constantes de choro e medo, eu meio que acordei. Lembrei que existem outras coisas fora disso. A sociedade não faz só violência; também faz arte. Eu gostava de escrever "Art will save me" antes mesmo de entender o significado disso. Não sei ainda se entendo, mas acordei pra ver que o ser humano é capaz de fazer uma conexão desinteressada com a natureza e com seus semelhantes, de fazer coisas que não tem outro objetivo se não admirar, engrandecer as coisas naturais. Lembrei da música, dos museus, da fotografia, da leitura.
Ontem eu vi um documentário que me despertou muito isso; era sobre a vida de Botso Korishelli. O jeito que ele levava a vida me tocou muito e eu chorei várias vezes ao longo do documentário. Porque a conexão que ele tinha com as coisas é o que me fazia falta. Ver o jeito que ele vivia me deu um ar, como se eu fosse tirada de um poço. Depois disso, eu decidi que não quero mais ser tão violenta quanto antes. Entendo minha agressividade; ela veio em resposta a muitas coisas que aconteceram e eu achava que precisava dela pra sobreviver. Mas, ironicamente, acho que isso também estava me mantando. Sei que dizem muito isso e poucas pessoas acreditam, mas eu realmente sinto que quando sou violenta, a pessoas a quem eu mais machuco sou eu mesma. Porque eu sou o mais contrário disso. Não entendo a violência, pra mim ela só é aceitável artisticamente.
Agora estou com esse novo norte, o de tentar deixar minha agressividade ou seja, minha insegurança. Não quero mais ter que ameaçar pra me sentir segura.
Dill, xx